terça-feira, 23 de outubro de 2012

O Artista (The Artist, 2012)


Quem lê esse blog com alguma frequência já deve ter me visto falar o quanto gosto de soluções inovadoras no cinema, jeitos diferentes de contar uma história, seja no roteiro, edição, fotografia, formato... sabe também o quanto eu aprecio o cinema clássico bem feito, no sentido de capturar através do filme o pensamento, cultura e costumes de uma época diferente, contados diretamente por quem os estava vivendo.

Com isso em mente, e com todo o "hype" atingido por O Artista desde a época da indicação para o Oscar, finalmente consegui parar e assisti-lo essa semana. Não sei se todos sabem, mas o diretor Michel Hazanavicius utiliza o filme mudo justamente para contar a história de George Valentin, um ator famoso e consagrado da época silenciosa que sofre com o advento do cinema falado e cai em desgraça, enquanto Peppy Miller, uma dançarina que começou sua carreira em um dos filmes de Valentim, desponta como a nova estrela do novo cinema.

A ideia é muito boa, um tipo de "metalinguagem", em que o mundo silencioso do protagonista em certos momentos vai sendo invadido pelos sons, aos quais ele resiste, insistindo em achar que fechar-se em sua realidade muda será o suficiente para manter seu sucesso. Foi uma ideia muito ousada e corajosa do diretor criar um filme mudo como maneira de contar essa história, recriando um gênero que estava morto de uma maneira, digamos, "modernizada".





Mas, para mim, faltou um detalhe crítico: uma boa história. É até covardia tentar comparar O Artista com outros filmes que tratam do mesmo tema (a transição do cinema mudo para o falado), como os clássicos Cantando na Chuva ou Crepúsculo dos Deuses (embora a própria abordagem do filme, se "vestindo" de filme clássico, tenda a forçar essa comparação), mas mesmo em relação a filmes contemporâneos, percebe-se que toda a ousadia utilizada na escolha do formato não aparece na história em si, que nada mais é do que uma sucessão de situações previsíveis, mostrando o sucesso, a derrocada, o desespero e a redenção do ator principal, ajudado pela bondosa mocinha da história. Sinceramente, nada de novo aí, a não ser a "capa" retrô. Muito pouco, na minha opinião.

A atuação de Jean Dujardin (premiada com o Oscar de Melhor Ator) também não ajuda muito. Enquanto assistia ao filme, inicialmente me pareceu que ele forçava a barra para se parecer com os atores do cinema mudo da década de 20 (canastrões ao extremo, quase por necessidade, já que a expressão corporal era vital). Mas ao longo do filme, para mim ficou claro que ele se tornou "escravo" das emoções fáceis, sem profundidade. É mais difícil se expressar sem falar? Sem dúvida, mas existem excelentes filmes mudos, e, afinal, ninguém obrigou diretor e atores a fazer o projeto dessa maneira. Lembrei-me então das aparições do ator no Oscar, e para mim ficou claro: estamos diante do Roberto Benigni do século XXI, que parece pitoresco a uma primeira vista, mas torna-se cansativo logo depois. Não acho que ele vá se destacar no futuro.





No mais, todos os clichês de Hollywood (e até alguns de novela da Globo) estão lá: a mocinha de origem humilde que sobe na vida mas continua com bom coração; o empresário inescrupuloso que vira as costas para o mocinho quando ele mais precisa; o ator orgulhoso que prefere desperdiçar sua vida a recomeçar de baixo; e até (como eu odeio!) o animal engraçadinho que rouba a cena e salva seu dono na hora mais importante. Ninguém merece...

Claro que é esperar demais coerência histórica e relevância cultural do Oscar, mas acho sinceramente que aqui ganhou a forma e não o conteúdo. Assisti poucos dos filmes que concorriam ao prêmio desse ano, mas claramente tinha coisa muito melhor. É uma pena, pois sou um entusiasta de experiências e novas maneiras de se contar histórias, e, queira ou não, esse filme levou muita gente a fazer algo inimaginável: ir ao cinema para ver um filme mudo em preto e branco. Só espero que a experiência não tenha afugentado esses espectadores....

Nota: 5,0

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