terça-feira, 31 de julho de 2012

Batman: O Cavaleiro das Trevas (The Dark Knight, 2008)


Com a abertura das Olimpíadas nessa sexta, pensei em escrever um post comemorativo comentando algum filme relacionado ao evento. Acabei percebendo que nunca vi nenhum. O mais perto que eu tenho de esportes olímpicos é Rocky, Um Lutador. Depois de colocar Carruagens de Fogo e Jamaica Abaixo de Zero na lista de filmes a assistir, pensei então em escrever um post referente à outra coisa que aconteceu nessa sexta-feira: a estreia nos cinemas de O Cavaleiro das Trevas Ressurge, terceiro filme da trilogia de Christopher Nolan que resgatou o personagem (que tinha sofrido com maus filmes, especialmente Batman Eternamente e Batman e Robin, de Joel Schumacher) de maneira brilhante. Ainda não vi o terceiro filme, mas isso deve ser resolvido rapidamente, e pretendo falar dele aqui em breve.

A lógica seria eu falar inicialmente de Batman Begins, mas O Cavaleiro das Trevas é um filme do qual eu gostei tanto que resolvi partir direto para ele. Como já disse antes, é um dos poucos filmes (senão o único) que para mim transcendeu o status de "um excelente filme de super herói" para "um excelente filme". Isso principalmente pela decisão (muito bem executada) de criar um filme hiper-realista. Claro que é complicado imaginar que um cara, para se vingar dos bandidos, inspire-se nos morcegos e gaste uma fortuna, treine a vida inteira, e se torne quase indestrutível no combate ao crime. Mas o filme é montado de tal maneira que isso passa a ser quase crível. A tal "suspensão de descrença", na qual se constrói um universo de tal modo internamente coerente, que você acredita na história, por mais que não seja possível no nosso mundo.

O fato de ser o Batman ajuda muito nesse sentido. Dentre os herois mais famosos, ele é o que tem a história mais "plausível". Claro que não foi isso que vimos, tanto na famosa e mega cafona série de TV dos anos 60 e mesmo nos filmes anteriores, de Tim Burton e especialmente de Joel Schumacher. Na época do Tim Burton, o clima ainda era um pouco mais dark, embora com um pouco de fantasia (e na época do Joel Schumacher, virou palhaçada mesmo). Já com Christopher Nolan, a palavra chave é realismo, desde Batman Begins.

A famosa origem do Batman (milionário que tem os pais mortos quando criança e dedica a vida a combater o crime) é recontada de maneira um pouco mais "pé no chão". A capa, a máscara, a bat-caverna, tudo ganha uma explicação "real", ou pelo menos uma razão para existirem no mundo real. O bat-móvel, por exemplo, é um protótipo de carro de combate, algo sendo desenvolvido nas indústrias de Bruce Wayne para o exército.


Agora, tudo podia ser a coisa mais real do mundo se o filme não fosse bom. E ele é ótimo. Apesar de ser uma continuação, a história é basicamente independente, e funciona muito bem. Livre de contar a origem do personagem, Nolan pode focar na história e nos personagens. Christian Bale já está mais à vontade no papel, e a lista de coadjuvantes do filme é extremamente respeitável: Gary Oldman, Morgan Freeman, Michael Caine, Aaron Eckhart em ótimos papéis. Um roteiro cativante, muito bem estruturado, que explora a reação das pessoas a situações extremas, e a dualidade entre bem e mal. Mas o destaque do filme, obviamente, é o Coringa de Heath Ledger. Em uma encarnação assustadora de um personagem com uma origem bastante doentia nos gibis, mas que nas telas tinha apenas as referências de Jack Nicholson (no filme) e Cesar Romero (na TV). E não é uma questão de sobrevalorizar um ator que faleceu. Seu papel é muito envolvente, bem realizado, e chega a deixar alguma dúvida se não contribuiu para o momento perturbado pelo qual o ator passou em seguida.


Independente de qualquer coisa, seu papel é impressionante, contribuindo demais para a qualidade do filme. Claro que não é apenas isso, mas dentro do clima realista do filme, é outro dos fatores que poderia soar exagerado, mas acaba sendo bastante crível. Claro que é difícil imaginar um maluco todo retalhado e maquiado gerando caos pela cidade, mas a interpretação de Ledger associada a algumas escolhas de roteiro (como por exemplo não tentar explicar sua origem) acertam em cheio em gerar a tal "suspensão da descrença" tão necessária para a credibilidade do filme. E ajuda a tornar o filme muito divertido.

Em resumo, o filme não só quebrou o estigma de filmes de heróis, como também acabou sendo um grande sucesso, sendo indicado e recebendo Oscars e sendo reconhecido como um dos melhores filmes de 2008. Eu, pelo menos, adorei. E talvez o maior defeito do filme (além de ter trocado a Katie Holmes de Batman Begins pela feiosa e sem graça Maggie Gyllenhaal) tenha sido criar uma enorme expectativa para a conclusão da trilogia. Quero só ver se o terceiro filme vai manter o nível dos 2 primeiros. Saberei amanhã...

Nota: 9,35 (8o colocado na minha lista de filmes favoritos)

PS: Claro que eu não poderia deixar de citar o "fan-film" mais famoso do Batman (ou quase isso). Ainda nos tempos pré-internet, um grupo de amigos com um microfone, um vídeocassete e muito tempo livre geraram o primeiro clássico do youtube: Batman na Feira da Fruta. Você já deve ter visto, mas por via das dúvidas, segue. É toscamente engraçado demais:


quinta-feira, 26 de julho de 2012

Letra e Música (Music and Lyrics, 2007)


Alguns filmes são ótimos e importantes por conta do conjunto da obra: história, fotografia, roteiro, atuações, trilha sonora, diálogos, tudo compondo um grande clássico. Cada cena do filme é uma ode à sétima arte, e a soma delas é genial. Daqueles filmes de que se falam por décadas, analisando-se cada take e utilizando-o como referência por gerações.

Já outros são lembrados por uma única cena. Letra e Música é um deles.

Era para ser uma comédia romântica como qualquer outra: um cantor outrora famoso, porém esquecido, sai de sua boa vida para compor uma nova música para uma estrela pop adolescente. Esbarra com sua falta de capacidade para compor, e acaba sendo salvo pela moça que contratou para regar suas plantas (!), e no processo, obviamente os dois se apaixonam. Depois de um desentendimento, percebem que foram feitos um para o outro e terminam felizes para sempre.

A escolha de elenco contribui: Hugh Grant como o inglês-meio-bobão-e-desajeitado-porém-charmoso (papel que desempenha em 99% de seus filmes, embora com boas atuações como em Lua de Fel e Quatro Casamentos e um Funeral), e Drew Barrymore como a garota bonita mas avoada que com seu charme acaba conquistando a todos. Até aí, o único fator (talvez) diferente seja a diferença de idade entre os dois (ele com 47, ela com 31 na época das filmagens). Nada de muito diferente, portanto.

MAS... talvez sejam os 3 minutos iniciais mais engraçados/bizarros da história das comédias românticas. Sério, caso não tenha visto, veja abaixo e em seguida continue lendo.


É uma sátira perfeita de um vídeo clip daquelas bandas de uma música só dos anos 80! Está tudo lá: as roupas cafonas, a música grudenta, os efeitos especiais toscos e super-utilizados, os cenários chamativos, as cenas incompreensíveis, as coreografias sem noção... me lembro de ter rido tanto nesse começo que simplesmente não tinha como não gostar do filme depois, por pior que fosse. E ruim não é, embora seja mais do mesmo. Não importa. Parafraseando Jerry Maguire, "you had me at hello"...

É de se admirar também que Hugh Grant tenha topado filmar o tal "clipe". Por mais que seja parte do personagem, e que tenha sido bem pago por isso, não é todo mundo que aceita um vexame desses.... Aliás, o filme todo tem um quê de crítica ao mundo da música, não apenas com a sátira aos anos 80, mas também à moda de reality shows esdrúxulos (ele é convidado para participar de um combate com outros cantores/bandas esquecidos, como REO Speedwagon, Flock of Seagulls, Debbie Gibson...), aos artistas rasos mas metidos a inteligentes (representados pela cantora, mistura de Britney, Aguilera e Shakira, que pede para que ele componha a nova música), e, claro, àqueles artistas que vivem até hoje de um sucesso de um passado cada vez mais remoto.

Como eu sempre digo, às vezes um filme não precisa ser perfeito nem mudar a sua vida. Basta te deixar com um sorriso no rosto. Esse, definitivamente, é um desses.

Nota: 7,0

terça-feira, 24 de julho de 2012

Cisne Negro (Black Swan, 2010)


Quem viu a minha lista de piores filmes, já deve ter percebido que não sou o maior fã de filmes de dança. Primeiro, porque filmes sobre dança (assim como filmes sobre futebol, música, e outros) têm como público-alvo (adivinhe!) pessoas que gostam de dança (e futebol, música...) e eu não sou uma dessas pessoas (apesar de ter já ter assistido tanto So You Think You Can Dance com a Chris que virei especialista). Segundo, e principal, porque a maior parte deles obedece ao que chamo de Teorema Dirty Dancing: não importa quais sejam os problemas (geralmente românticos, claro), basta dançar que eles se resolvem. Lembram em Dirty Dancing? O pai da garota não queria que ela chegasse nem perto dos eventos de dança ou do Patrick Swayze. Bastou vê-la dançando com ele que tudo ficou bem, tá perdoada, e até dançou com a mulher na cena final, onde todos se reúnem em uma coreografia (cena essa onipresente nesses filmes também).

Tudo isso para dizer que não tinha grandes expectativas quando fui assistir a Cisne Negro, apesar de saber que era um drama mais sério, e apesar de admirar bastante o trabalho do diretor Darren Aronofsky (Pi, A Fonte da Vida, O Lutador, Réquiem for a Dream). Fui surpreendido por um filme muito interessante, extremamente bem feito, e com uma história que, levemente baseada no balé O Lago dos Cisnes, explora muito bem os conflitos internos da protagonista, desde pequena muito controlada pela mãe, que fez com que ela seguisse seus passos de bailarina até ganhar o papel principal no balé.

O filme pinta o "mundo do ballet" de forma até assustadora. A obsessão pelo sucesso, a dedicação doentia, a cobrança intensa formam um cenário bastante denso do ballet como atividade. Mas é nos conflitos psicológicos e na análise do brutal impacto desses fatores sobre a personalidade da personagem principal que o filme se destaca. O filme acompanha a história de Nina (Natalie Portman), jovem bailarina recém-promovida ao papel principal de "O Lago dos Cisnes" em uma montagem em Nova Iorque. Segundo o diretor da montagem (Vincent Cassel), ela, com sua personalidade doce e submissa, é perfeita para o papel do Cisne Branco, mas deve encontrar dentro de si seu lado sensual e rebelde para o papel do Cisne Negro. Isso se mostra bastante difícil, uma vez que esse foi o lado que ela sempre reprimiu, um pouco devido a sua mãe, que continua a criando e controlando como se fosse uma criança. Isso gera um enorme conflito em Nina, acentuado pela presença de Lily (Mila Kunis), que apesar de se mostrar bastante amigável com ela, logo se mostra uma potencial adversária pelo papel principal.





Previsivelmente, Nina começa a enlouquecer. Nesse ponto, mostra-se a principal virtude dos filmes de Aronofsky: a representação visual dos conflitos internos de seus personagens. Muito rapidamente, o espectador já não sabe o que é real e o que está na cabeça de Nina. O filme é cheio de espelhos, e conforme o filme passa, as cenas que vemos refletidas vão se afastando cada vez mais da realidade, como que representando a divisão entre as personalidades de Nina. Conforme a estreia se aproxima, sua loucura vai aumentando, e chegamos a duvidar se ela terá condições de continuar.


Claro que não vou contar o final, mas vale destacar ainda a atuação de Natalie Portman no papel principal. Desde a preparação (ela está assustadoramente magra, e aprendeu a dançar para o papel), até a atuação, dando um equilíbrio suave entre a menina assustada e a bailarina agressiva. Vincent Cassel, Mila Kunis e até Winona Ryder também estão bem imersos nos papéis, criando um ambiente assustador, com toques de amizade, romance, erotismo e competição. Ou seja, um filme altamente recomendado, mesmo para quem não é fã de dança como eu.


Nota: 8,4 (38o colocado na minha lista de filmes favoritos)


PS: Tudo isso acima (inclusive a nota) não leva em conta a famosa cena de sexo entre Natalie Portman e Mila Kunis. E eu quase consegui terminar o post sem falar dela. Mas, bem, não deu. Na época falou-se muito sobre isso, e com justiça. Eu poderia tentar dizer que é pela fotografia, ou pelo significado para o filme (ela transgredindo suas regras e libertando seu lado "negro" que estava reprimido), mas quer saber? A cena é legal por causa das duas mesmo. :-)







quinta-feira, 12 de julho de 2012

Casablanca (1942)



Depois de algum tempo sem publicar no blog, e por ter acabado de receber (e assistir) a edição especial em Blu-Ray do 70o. Aniversário do filme, resolvi enfim assumir a responsabilidade de falar sobre meu filme preferido de todos os tempos. Curioso que, durante um tempo, quando montei minha lista de filmes preferidos, De Volta para o Futuro 2 e O Império Contra-Ataca tenham sido candidatos fortes ao topo do ranking, mas no final acabei escolhendo Casablanca mesmo. Mais do que falar sobre o filme, cuja história acredito que a maioria conheça, acho justo tentar justificar o que, afinal, faz com que este seja o filme de que gosto mais.

Para quem eventualmente nunca viu (saia daqui e vá assistir, seu louco!), o filme, feito ainda durante a II Guerra, conta a história de Rick (Humphrey Bogart), um cínico americano que possui um bar em Casablanca, cidade no Marrocos que se tornou um destino procurado por aqueles que querem fugir do nazismo para os Estados Unidos. Um dia, entra em seu bar Ilsa (Ingrid Bergman), que foi o grande amor de sua vida, mas está casada com o líder da resistência Victor Laszlo (Paul Henried), e os dois procuram uma maneira de fugir, sendo perseguidos pelos nazistas. Neste momento, Rick se divide entre o amor por Ilsa e a possibilidade de ajudar Laszlo, e deve decidir o que fazer.



Parece uma história de amor comum, de um casal apaixonado lutando contra as dificuldades, e não deixa de ser. Mas, como sempre, o que importa mais é como a história é contada. Assim, acho que algumas coisas explicam porque esse filme, para mim, é considerado quase perfeito:

- A história: apesar de um tanto batida, a história consegue situar bem o caso entre os dois dentro do contexto da guerra e do local (impressionante como a guerra, além da cidade de Casablanca, são como personagens do filme). O uso das cartas de trânsito como "McGuffin" (segundo Hitchcock, o objeto que todos querem mas cuja natureza não é relevante) funciona muito bem, e a dicotomia entre o amor e o dever move a história de maneira muito fluida. O suspense de como vai acabar o filme é bastante eficiente e o final soa bastante natural, dentro das circunstâncias.

- Os personagens: é impressionante a construção dos personagens. Sem pressa, mas de maneira direta. Em poucas cenas, você já sabe quem é Rick, ao mesmo tempo em que aos poucos vai se surpreendendo com suas atitudes. A "mocinha" do filme só aparece com 25 minutos de filme, e rapidamente se entende o tipo de conflito que ela tem com o personagem principal, embora os detalhes vão sendo mostrados aos poucos. Os demais - o policial francês, o major da GESTAPO, o ladrão italiano (Ugarte, uma fantástica criação de Peter Lorre, de O Vampiro de Dusseldorf, que marca o filme apesar de poucos minutos em cena) - são não apenas bem construídos como maravilhosamente interpretados. A química entre Humphrey Bogart e Ingrid Bergman é perfeita, e os coadjuvantes contribuem demais para a história, tornando a experiência muito mais rica.

- a música: "As Time Goes By" deixou de ser apenas uma trilha sonora de filme, e também é um personagem em Casablanca. O curioso é que quase foi limada do filme: o responsável pela trilha sonora quis tirá-la do filme depois de pronto. Só não conseguiu porque certas cenas teriam que ser refilmadas, e Ingrid Bergman já havia cortado o cabelo para Por Quem os Sinos Dobram. Ironicamente, justamente o fato de estar tão entranhada no filme salvou a música de ser esquecida. E a música aparece em grande estilo: o reencontro entre os ex-amantes acontece justamente por causa de "As Time Goes By", com a icônica frase "Play it, Sam" (e não "Play it Again, Sam", como muita gente acha). Um dos momentos-chave do cinema.



- a fotografia: Casablanca, no Marrocos, é uma das cidades que quero conhecer no mundo por fatores aleatórios (junto com Vladivostok, por causa do War, e Greenwich, por causa do meridiano). Tudo, claro, por causa do filme. Obviamente não vou encontrar o "Rick's Café Americain" e muito menos Rick e Ilsa por lá, mas a ambientação do filme é perfeita, mostrando a cidade e os principais cenários de maneira muito bonita.



- o "imaginário coletivo": Algumas obras de arte, sejam filmes, pinturas, músicas, transcendem seu status de obra de arte e passam a fazer parte da cultura das pessoas. Nesse caso, atingem de fato o status de clássicos. Cenas como a Marselhesa no bar, os números musicais de Sam, os flashbacks de Rick e Ilsa, até a cena final no aeroporto (com fog no deserto, veja você!) entraram para o "inconsciente coletivo", mesmo 70 anos depois de feitas. As frases do filme ecoam até hoje. E afinal, não é qualquer filme que consegue ser homenageado pelo Pernalonga e pela Turma da Mônica...




- a "ousadia histórica": tá bom que o filme foi pensado como propaganda de guerra, em uma época de máximo domínio nazista na Europa e quando os Estados Unidos tinham acabado de entrar no conflito. Mas não deixa de ser corajoso e relevante falar sobre o sofrimento da II Guerra em 1942, enquanto ela ainda acontecia. E, se há alguma manifestação patriótica no filme, é francesa e não americana. Críticas como "Dê ao Major Strasser a melhor mesa!" / "Já fiz isso, ele é alemão e a tomaria de qualquer jeito" davam um tom incrivelmente atual ao filme, em uma época onde o cinema era regulado por várias "leis de conduta" (tanto que houve dúvidas se a censura liberaria mostrar Ilsa e Rick como amantes, dado que ela era casada com Lazslo). Quantos anos levou para a Guerra do Vietnã aparecer em um filme importante?

- o fator pessoal: acho que essa é a principal razão para que eu goste tanto de Casablanca. Devo ter visto o filme pela primeira vez com uns 15 anos, pegando por acaso em algum Corujão da vida. Gostava de filmes, mas sem nunca ter me interessado propriamente por cinema. E, sem internet, nem sabia quais eram os filmes clássicos, e me interessava menos ainda. Não me lembro, mas a própria decisão de parar para ver aquele filme preto e branco no meio da madrugada foi algo bastante fortuito (ou resultado de um tédio monstruoso). Pois bem, o que me lembro bem foi o quanto me surpreendi e adorei o filme. Não percebi na hora, mas foi o início de uma visão muito mais ampla e interessante sobre o cinema, e com certeza contribuiu muito para que eu gostasse tanto do assunto nos anos seguintes. Ajudou também a me fazer perceber que coisas boas poderiam vir fora da "zona de conforto" dos filmes que um adolescente de 15 anos procura assistir. Descobri e assisti muita coisa boa (e ruim) depois disso, mas o lugar especial esta lá, para um filme não apenas fantástico, mas que principalmente me fez ver tanta coisa depois...

É como se no final do filme, fosse o cinema em si me dizendo "I think this is the beginning of a beautiful friendship"...


 Nota: 9,9 (1o colocado na lista dos meus filmes favoritos)



segunda-feira, 2 de julho de 2012

Piaf - Um Hino ao Amor (La Môme, 2007)


Outro sub-gênero do qual ainda não tinha falado aqui no blog é o de Cinebiografias. Pra ser sincero, tendo a não gostar muito de biografias, seja em livros ou no cinema. Pensei um pouco e cheguei a 2 motivos principais. Um é "filosófico": acho que prefiro histórias originais, onde os autores não se prendem a acontecimentos reais, do que uma recontagem de coisas que aconteceram. Talvez por isso também não seja o maior fã de documentários. O outro motivo é a "chapa branca": com poucas exceções, biografias (especialmente no cinema) tendem a idealizar e romantizar a vida do retratado, minimizando defeitos ou decisões erradas, e principalmente dando um ar de triunfo e unidade à vida, como se tudo que acontecesse tivesse uma razão ou propósito, o que dificilmente retrata a realidade.

No entanto, a biografia se suporta principalmente no nosso desejo de ver que todos têm seus altos e baixos, sofrimentos, e conhecer detalhes de suas vidas que às vezes não sabemos. O caso de Piaf é exatamente esse. Sua vida era um filme esperando para ser feito: nascida em uma família muito pobre da Normandia, ela foi abandonada pela mãe, e deixada pelo pai para ser criada pela avó, dona de um bordel, que contou com as prostitutas para dar conta da tarefa. Ficou cega dos 3 aos 7 anos devido a uma doença desconhecida na época, teve uma filha que morreu aos 2 anos, tudo antes de ser descoberta cantando na rua com uma amiga. Seis meses depois, seu descobridor foi assassinado e ela acusada de sua morte. Apesar de ter morrido aos 47 anos, é ainda considerada uma das maiores (senão a maior) intérprete francesa, e tem centenas de músicas gravadas.

E como isso foi transformado em filme, afinal? Dada a profundidade de acontecimentos a serem mostrados, minha opinião é que ficou muito confuso. Normalmente gosto de decisões inovadoras de roteiro, mas a estrutura não-cronológica para mim não ajudou muito. Acho que ficou uma dificuldade de entender o que se passava quando, e ligar as reações dela aos acontecimentos passados. (Claro que o fato de ter assistido em 2 vezes, tendo que parar no meio, também não ajudou muito nesse sentido)

No entanto, esse filme tem um fator que muda tudo: Marion Cotillard. A então desconhecida (e linda) atriz francesa entra no papel de um jeito que poucas vezes vi (dizem que acontece o mesmo com Jamie Foxx em Ray, mas nunca assisti). Imagino como deve ter sido para os franceses, que conhecem a cantora muito melhor que eu, verem um de seus ídolos retratado com tamanha paixão. Além do Oscar que ela recebeu, merecidamente (embora seja lei que o Oscar de Melhor Atriz seja sempre dado para a atriz que sofreu a maior transformação física, preferencialmente ficando mais feia - Gwyneth Paltrow em Sheakespeare Apaixonado, Charlize Theron em  Monster, Nicole Kidman em As Horas são alguns exemplos que me vêm à cabeça), esse filme a tornou conhecida, abrindo portas para ótimas atuações em filmes como A Origem e Meia-Noite em Paris. É impressionante, você praticamente não enxerga a atriz por trás do papel (especialmente nas cenas com Piaf mais velha), é como se ela incorporasse a personagem nestas cenas. E é muito legal ver atuações nesse nível.


Assim, apesar de não gostar tanto assim de biografias, e de ter visto alguns defeitos neste filme em especial, não posso deixar de recomendá-lo. Pelo menos 50% da nota dele vem da atuação de Cotillard, e "não, não me arrependo" de tê-lo visto :-)

Nota: 7,0